Acordara de manhã e, ainda com ramela nos olhos, encontrou sua mãe no banheiro a se maquiar, disse "Bom dia...", e sua mãe a olhou com os olhos já delineados e disse "Bom dia..."com os lábios, mas dizendo: "Talvez fosse um bom dia se o meu chefe não aparecesse na repartição e seu pai me levasse pra jantar..." com os olhos.
"Hora, convide papai para jantar e não dê tanta atenção assim ao seu chefe!"exclamou a menina. A mãe a olhou espantada perguntando meio à garota meio à si mesma se teria dito seu pensamento em voz alta. A menina foi-se pelo corredor e a deixou lá, com seu questionamento.
Trocou-se, pegou todo seu material e olhou-se no espelho do aparador. Estava diferente, dormira tão bem sonhando com "Ele".Como seria dormir tendo a certeza do seu abraço, do seu beijo, do amor d'Ele? Nos sonhos ela já sabia como era.
Tomou café silenciosamente ao lado do pai, ela divagando sobre sua paixão juvenil e ele protegido pelo jornal, uma grande fuga quando não se tem assunto.Logo veio a mãe, correndo e dizendo do atraso, nem sequer olhando a mesa ou tudo ao seu redor. "Vamos menina ou você perde a primeira aula e eu ganho uma bela chamada!"
Seguindo a mãe disse "Até" ao pai e foi, toda esvoaçante até o carro. Não é que estava excitada pela escola, a escola em si não a animava, mas "quem" estava na escola trazia toda essa euforia.
No caminho a mãe foi silenciosa e a menina mais ainda, uma nem sequer olhara para a outra e no fim do percurso ela percebeu que a mãe estava com ocupações demais para ser sua caixa de confidências. Disseram apenas "Thau" mas ela viu, no fundo dos olhos da mãe uma frase.
"Queria tanto que as coisas fossem diferentes." Essa frase estava batucando em sua cabeça como "I just called to say I love you", não era uma música, mas parecia. Como ela leu ou ouviu isso?Como podia ver o que olhares diziam? E porque sua mãe estava pensando isso? Simplesmente porque sua vida não era como sonhara...E isso a mãe teria de resolver sozinha.
Enquanto ela pensava na vida chegou "aquela pessoinha". Olhou-a dentro dos olhos dizendo "Ele é meu!" sem nem ao menos mexer os lábios. Agora sim, ela estaria ficando louca? Sabia que as pessoas falavam com olhos, mas nunca pensara nisso como algo real e incontestável. Sem pensar duas vezes, disse com sua voz terna e sábia: "Ninguém pertence à qualquer ser deste mundo.Tenha um bom dia"
A pessoinha empinou o nariz e saiu do alcance dos seus olhos.Definitivamente ela não havia entendido nada...E isso não deixava de ser engraçado!
Logo "A amiga" chegou. Se abraçaram apenas e naquele instante de infinito nada precisou ser dito e tudo foi entendido. Ela disse a amiga: " Estou entendendo o que os olhos dizem..." e a outra simplesmente disse "Eu tinha certeza que um dia você entenderia". A abraçou novamente e seguiu pelo corredor, o sinal havia tocado. A menina foi para sua sala sem entender muita coisa.
Enquanto ela olhava para o nada que a lousa vazia representava "Ele" chegou. Suas pernas bambearam e suas maçãs do rosto ficaram ainda mais rosas. Um sorriso de canto de boca pareceu quando ele lhe digiriu o olhar, que dizia apenas "Bom dia!". Ela apenas mexeu os lábios mas som nenhum saiu...Ele sentou-se ao seu lado. Ela ficou mais rubra ainda. E a aula começou e seguiu seu curso, com ela vendo o tédio das mentes de alguns professores, a sabedoria dos pensamentos de outros e a realização nos ensinamentos de alguns.
Logo depois do almoço, antes do professor chegar, Ele sentou-se e disse: "Você vai de ônibus hoje?" e ela respondeu "Sim" com uma voizinha tão pequena quanto a palavra. Olhava em seus olhos e nada lia...Ele disse: "Que bom! Assim quem sabe você pode me explicar literatura? Eu não entendo Fernando Pessoa...Eu guardo seu lugar no ônibus." Ela novamente disse apenas que sim.
A aula continuou e ela não conseguia entender nada que o professor dizia, não entendia os números e parecia que se esquecera do que as palavras diziam...
O tempo passou arrastado mas passou e logo chegou a hora de ir embora. Correu até o ponto, entrou no ônibus e logo ouviu um "Aqui! Eu guardei seu lugar". Olhou a frente e viu aquela mão que tanto observara durante suas aulas e logo depois viu os olhos que tanto lhe impressionavam com sua cor de mel, mas sem ler o que poderiam dizer.
O caminho foi mais curto do que ela queria, enquanto ela lhe explicava " Meu olhar é nítido como um girassol" ou então "Pensar é negar o sentir", ou então "Nada me prende, a nada me ligo, a nada pertenço" e por fim "Segue o teu destino,/Rega as tuas plantas,/Ama as tuas rosas./O resto é sombra de árvores alheias."
Pertíssimo do seu ponto, ela disse, não querendo dizer, "Eu desço aqui."
E ele simplesmente respondeu "Eu sei" E dando-lhe um beijo no rosto disse "Obrigado".
Ela ia levantando quando ele segurou sua mão, nada disse, mas ela entendeu o que o mel dos seus olhos diziam...
" Você não faz ideia de como eu te admiro! E mesmo não sabendo o que realmente é, sei que sinto algo maior que isso."
Ela ainda pensava no que havia visto-ouvido com olhos deitada na cama. Na verdade, pensou o tempo todo. Não se lembrava do que havia jantado, nem o que havia visto na televisão, apenas lembrava que era sensível o suficiente para ler o que os olhos diziam e que isso fazia algo ser melhor, na verdade, muito melhor em sua vida. Ler as pessoas podia fazê-la feliz...E Ele a admirava...E isso não era o todo, era apenas o início.
2 olhares incomuns:
Gostei do texto :D
Nossa, que texto juvenil! Fazia anos que não lia um desses. Lve.
Beijos
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